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«Fado serenata» do Hylario e «O sancristán de Coimbra»

Estudo comparativo das melodias

A melodia da canção (fado) conhecida na Galiza como «O sancristán de Coimbra» é a melodia do «Fado serenata» de Augusto Hylario, que foi publicado em partitura pela Casa Neuparth & C.ª (Rua Nova do Almada, Lisboa) em 1894. 

Esta afirmação, não sendo inteiramente novidade (pelo menos António Manuel Nunes já o referiu), merece fundamentação, recorrendo, primeiro, à análise objectiva dos intervalos musicais (como se de um algoritmo de detecção de plágio se tratasse) e à análise da estrutura musical (ritmo e harmonia) e, segundo, à análise de outros aspectos como a letra, a adição de refrão, o contexto histórico e outros.

Independentemente das alterações rítmicas e melódicas que sofreu (que, aliás, as singelas composições, conhecidas formalmente como «fados», admitem e promovem) e da harmonização em tom menor (com passagem ao tom maior no refrão ou estribilho), a assinatura melódica é na, minha análise, a mesma.

Em Portugal, aproximadamente em 1906, esta melodia foi fundida com outra -- também da autoria de Augusto Hylario; ambas publicadas em partitura, para voz e piano, no Cancioneiro de César das Neves -- e é hoje conhecida como a parte inicial do «Fado Hilário moderno» ou simplesmente como «Fado Hilário» (fusão atribuída ao cantor Manassés de Lacerda).

Na Galiza, esta melodia é conhecida como «O sancristán de Coimbra». É cantada em tom menor e tem um refrão que realça e vincula a ligação ao universo do fado («E bate fado e bate bem, tu és a causa do meu desdém»). Duas das quadras cantadas remetem para Coimbra. A quadra do «mar também tem amante» foi publicada com o «Fado Serenata» de Augusto Hylario in Cancioneiro César das Neves; esta e a quadra d' «O sacristão de Coimbra», ambas foram cantadas por Augusto Hylario (ver  Commercio de Portugal, n.º 4.686, anno XVII, 10 de Março de 1896). [Esta canção já foi gravada por vários artistas galegos com diferentes roupagens harmónicas e rítmicas.]

Formalmente, esta composição é, de facto, um fado e na Galiza ficou com um “refrão” (ou foi preservado o refrão!?) que musicalmente em tudo mimetiza os característicos interlúdios musicais (do fado corrido menor ou maior), sincopados, dedilhados na guitarra, que se ouvem entre as quadras cantadas (ou entre as partes melódicas, em versões instrumentais). Ver apontamento «Augusto Hylario bem vivo na Galiza».


Os fados, em marcação binária, andamento ligeiro e com as suas síncopas características, eram dançados e cantados, e não se limitavam a duas quadras. A cantoria e a coreografia de uma destas composições poderia alongar-se ao longo de muitos minutos, à semelhança de qualquer outra dança de grupo que (para comparação) acontece em ocasiões como as fogueiras de S. João. Nos interlúdios os bailadores poderiam bater palmas, cantar um refrão, gritar palavras ou interjeições (Yei! Yuuh! Vai! Volta! Bate!…).

Na Galiza ninguém associa esta composição ao «Fado serenata» de Augusto Hylario, apesar de a própria composição, não esconder as suas origens (bem pelo contrário, só revela). Então qual é a melhor explicação para este fenómeno da popularização da melodia na Galiza?

A malta da Tuna Académica de Coimbra de 1896 ainda dançava/batia o fado (ver Gabiru 1896, «Umas férias em Madrid») e, em 1898, levaram a recordação do companheiro Augusto Hylario (ver «Egas Moniz e a memória académica») para a Galiza (Santiago de Compostela), que lá ficou até hoje.

Ver «A visita da Tuna de Santiago de Compostela em Fevereiro de 1888»


A. Caetano, 8 de Setembro de 2024


O Sancristán de Coimbra


O Sancristán de Coimbra

facía de mil diabluras

mollaba o pan en aceite,

deixaba os santos a escuras


E bate fado e bate ben,

ti ére-la causa do meu desdén


O mar tamén ten amores,

o mar tamén ten muller

Está casado coa area,

Dálle bicos cantos quer


Eu quixera ser merliño

e te-lo bico encarnado

para face-lo meu niño

no teu cabelo dourado


Tirei unha laranxiña

no medio de Portugal

a quen lle foi a batere?

á filla dun xeneral


Miña nai xa non me deixa

levar o leite a Coimbra

porque dicen os rapaces:

ai, que leiteira máis linda!



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